segunda-feira, 21 de junho de 2010

A mulher de elite do século XIX[1]




Elane Carvalho
Janaína Rios
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A mulher do século XXI é conhecida por sua independência, a qual demorou milhares de anos para ser alcançada. Foram inúmeras lutas e protestos. Durante muito tempo esteve submissa ao marido e aos padrões da sociedade. Vivendo assim, numa cadeia circunstancial, não podendo ter o prazer de desfrutar a sua própria vida.
Muitos são os autores, que escrevem e debatem á respeito do processo de independência feminina no decorrer dos séculos. Contudo, autoras como Joana Maria Pedro, Mary Del Priore, entre outros, deixam claro que a conquista de espaço não foi algo meramente espontâneo. As mulheres não permaneceram omissas ou passivas diante da sociedade preconceituosa.
No cenário do século XIX, uma sociedade sistemática apoiada em pilares preconceituosos. Nesse contexto nas entrelinhas da história é possível traçar o perfil da mulher brasileira, suas aparições, revoltas, sentimentos, se silencio, suas lagrimas.
De acordo com Maria Ângelo D`Incao, havia um referencial para família burguesa:

“um sólido ambiente familiar, o lar acolhedor, filhos educados e esposa dedicada ao marido, ás crianças e desobrigada de qualquer trabalho produtivo, um tesouro social imprescindível”.
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Neste modelo pode-se observar, o retrato da família “perfeita”, colocando a mulher como responsável pelo lar, educação dos filhos e inteiramente dedicada ao marido ainda para DÌncao, as mudanças ocorridas no campo social do século XIX, dando inicio a vida urbana, possibilitou a presença da figura feminina no meio social, permanecendo porém, sob avaliação e opinião dos outros.Essa mulher elitizada, agora começa a freqüentar lugares como teatros, bailes, cafés , entre outros acontecimentos da comunidade.
A mulher tinha o dever de zelar pela imagem familiar, mas principalmente do pai ou esposo.
Foi nesse período que se passou a valorizar a maternidade. Durante muito tempo a criação dos filhos, desde a amamentação e a educação dos primeiros anos de vida era feita pela ama de leite. A partir do século XIX, a presença da mãe tornou-se indispensável sendo dela a responsabilidade de instruir os filhos dentro dos parâmetros da sociedade.
A maior parte dos casamentos eram acordos políticos-economicos entre famílias ricas, através desses arranjos buscaram se manter ou adquirir estatus. Os enlaces matrimoniais aconteciam na sua maioria sem sentimento algum. Muitas mulheres só conheceram o marido no dia do casamento sendo que a beleza não era requisito para que o homem a cortejasse, porém o dote oferecido pela família da jovem era fator primordial para que houvesse a corte.
As moças eram instruídas desde cedo para o casamento, pois deveriam tornar-se “devotas” a seus maridos e boas mães.
Havia uma vigilância constante para com essas jovens com o intuito de preservar a castidade e consequentemente o nome da família. Dentro dos conceitos da época a virgindade feminina era algo primordial.
No sertão nordestino o casamento era visto com preocupação por não haver muitas famílias abastardas. A procura por um pretendente para a filha dava-se logo depois com sua primeira menstruação. O enxoval começava a ser confeccionado com isso crescia uma grande angustia por parte da família e da jovem, receosos de não conseguir o tão sonhado casamento, muitas moças não conseguiam parceiros a altura ou não possuíam dotes para o casamento, permanecendo solteiras sendo alvo de chacotas. Apos os 25 anos a mulher que não conseguisse pretendente era considerada velha para constituir o matrimonio. Rotulada como “moça velha”, moça que tinha dado o tiro na macaca ou que havia chegado ao caritó. (FALCI, 2008).
Não é difícil imaginar quão tensos foram os anos que antecederam os casamentos. A aflição da moça diante dos acontecimentos era tão grande que as perguntas eram constantes: Será que conseguiriam um casamento?O dote seria suficiente para atrair um bom moço? As indagações eram muitas, porém as respostas só eram dadas pelo tempo e pelos esforços familiares e de cada moça que não queriam ser rotuladas e nem apontadas pela sociedade.
O casamento só deveria acontecer com a permissão dos pais, porém muitas moças casavam sem esse consentimento sendo deserdadas por se unirem em matrimonio àqueles que haviam conquistado seu coração.
A solução que algumas jovens encontraram para obterem a benção da família para o namoro desejado foi “rapto consentindo”.Tudo era combinado,a moça era conduzida a alguém importante da cidade ou da região, como o juiz ou pessoas de laços familiar com o rapaz.Nem sempre acontecia de ter relações sexuais entre os enamorados .
A família da moça era avisada e o rapaz colocado contra parede não havendo alternativas para a desistência do ato matrimonial, caso contrario a reputação da família estaria ameaçada, pois a moça se tornaria “mulher perdida”.
É exatamente nesse contexto que torna possível a visibilidade da reação feminina contra as regras impostas pela sociedade. Os protestos se deram de varias formas, as que enfrentaram a família em nome de um amor, desafiando não apenas a autoridade patriarcal mais todo um sistema que por conseqüência poderia discriminá-la, excluindo-a do convívio social em nome da “moral inabalável”.
As tensões não se davam apenas nas expectativas pré-matrimonial. Muitos casamentos trouxeram a infelicidade, devido o tratamento que a esposa recebia de seu conjugue. A violência física era comum em muitos lares, levando em conta que algumas mulheres foram violentadas sexualmente por seus maridos. Não havia espaço para afinidade sexual. Proibida de desfrutar dos prazeres da vida sexual, somente “mulheres de vida fácil”, podiam dar e receber prazer.
As vestes femininas diziam muito de cada mulher, e essas variavam de região para região. Mulheres da elite nordestina usavam de simplicidade, trajando-se de forma a não chamar atenção, principalmente dos homens. Com roupas muito bem compostas e não abusava nos acessórios. Através desse perfil pode-se notar que a beleza externa não era prioridade na vida das mulheres nordestinas. Ao contrario dos dias atuais os padrões de beleza passavam bem longe do corpo magérrimo sem qualquer gordurinha. Na verdade, tal condição desqualificava sua imagem. Sinônimos de formosura estavam nos quilinhos a mais.
Miridam Knox Falci, chama à atenção as atividades que as mulheres desenvolviam:

“Eram treinadas para desempenhar o papel de mãe e as chamadas “prendas domésticas” orientar os filhos, fazer ou mandar fazer a conzinha, costurar e bordar. Outras, menos afortunadas, ou de uma elite empobrecida faziam doces por encomenda, arranjos de flores, bordados a crivo, davam aulas de piano e solfejo, e assim puderam ajudar no sustento e na educação da numerosa prole”.
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Dentro da elite, havia divisões de classes, mulheres mais abastadas não desempenhavam atividades domésticas, estando sujeitas ao ócio. As que por algum motivo precisava desempenhar tais atividades, não eram bem vistas diante da sociedade que as discriminavam por concluírem que o homem da casa não era capaz de sustentar o próprio lar.
Durante muito tempo as mulheres se viram excluídas do meio escolar. Quando crianças lhes eram negadas o estudo das ciências, geométricas entre outros lhes passando apenas os conhecimentos básicos tais como escrita, leitura e as principais operações matemáticas. A maioria mal aprendia assinar o nome, enquanto os rapazes se aprofundavam nos estudos e eram enviados a escolas de outras localidades. Às moças eram ensinados a costurar, bordar, cozinhas e quaisquer afazeres designados femininos. Essa realidade poderia ser notada em varias regiões como enfatiza Miridan Kinox Falci no sertão nordestino:

“Apenas 27.776 pessoas da província de um total de 202.22 habitantes eram alfabetizadas, e dessas 27, pouco mais de 10 mil eram mulheres”.
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Porém nas ultimas décadas do século XIX a situação em relação ao âmbito escolar e o acesso feminino começa a mudar. Crescia a necessidade da educação às mulheres. Acreditava-se que com instrução a função de cuidar da educação dos filhos de forma correta estaria garantida mantendo fora do lar toda influencia capaz de corromper o pilar familiar.
A formação estaria ligada à vida religiosa. Escolas católicas eram responsáveis pela educação das moças afim de que elas adotassem a figura da Virgem Maria como exemplo de vida:

“Através do símbolo mariano se apelava tanto para sagrada missão da maternidade quanto para a manutenção da pureza feminina”.
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Através do referencial imposto buscava-se a atenção das mulheres quanto ao pudor, deveres como cuidar do lar, almejando ser o que a igreja e a sociedade definiam como a “perfeição feminina”.
Aos poucos a subordinação dá espaço às conquistas por meio da participação nas escolas normais, agora não apenas como alunos, mas como professoras.
Com a urbanização e industrialização outras alternativas de emprego foram surgindo e muitos homens abandonaram as salas de aulas. As mulheres passaram a ser maioria no magistério sendo cada vez mais responsáveis pela educação, agora não apenas dos seus filhos, e participantes de atividades docentes contribuindo para o desenvolvimento social das famílias. A maternidade foi fator de importante contribuição para a conquista deste espaço. Conquanto, nem todos concordaram com as novas transformações que implicaram as modificações nos costumes da sociedade. Mesmo sob influencia da Revolução Francesa onde a figura feminina possa ser redefinida, muitos insistiam em Avelar - se diante das mudanças.
Para Norma Teles a mulher ainda estará nos bastidores das obras. Contudo é preciso ressaltar que foi a partir dessa época que um número significativo de mulheres começou a escrever e publicar livros, inclusive no Brasil, ressaltando a negação que era atribuída às mesmas quando se referia à educação superior. É certo que, essas obras são criticas a posição da sociedade diante das virtudes femininas, um desabafo que quebra o silêncio, tingindo papel com sentimentos antes adormecidos na alma, daquelas que durante muito tempo estiveram acorrentados ao próprio medo.
Com a integração da mulher no meio literário almejava-se a ruptura com as relações de negação do se eu e suas possibilidades que giravam em torno de sua ascensão, é por esses e outros aspectos que Norma Telles afima que:
“cria um circulo vicioso: como não tem instrução, não está apta a participar da vida publica e não recebe instrução por que não participa dela”.
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Os trabalhos escritos por mulheres do século XIX sofreram represarias durante muito tempo, não eram reconhecidos nem valorizados como mereciam. Mas eram neles que elas depositavam todos os seus anseios, na esperança de alcançarem outros adeptos, a fim de formar uma corrente que pudesse conquistar mais elos, fortificando-se diante da sólida nação preconceituosa.
Foi na escrita que mulheres conseguiram expressar seus sentimentos, através de romances e outras literaturas tentavam tirar a imagem da mulher voltada para o lar e as vontades do marido. Elas agora apresentavam uma figura mais forte, com determinações e protagonizavam heroínas, amavam e eram amadas. Houve também as que se arriscaram em volver seus escritos na política . Muitas surgiram nesse meio, onde ao lado de abolicionistas defenderam o fim da escravidão, fazendo discursos em praça publica e escrevendo artigo em jornais sobre o direito de libertos. (TELLES, 2008).
A ousadia podia comprometer a reputação de toda família, mais para elas significava o primeiro passo para a vitória na batalha por dignidade, aceitação e participação dentro do meio de convívio. Era a tão sonhada inclusão almejada por suas antecessoras e a abertura para um novo mundo que décadas mais tarde possibilitou o ingresso feminino na vida publica.
O processo de inclusão feminina aparti não foi do século XIX, não foi, portanto algo linear e homogêneo. A transformação dos costumes não se deu forma espontânea, foi preciso passar.























REFERENCIAS:


DEL PRIORE, Mary. História do amor no Brasil. São Paulo: Contexto, 2005.

D`INCAO, Maria Ângela. Mulher e família burguesa. In: Del Priore, Marry (org.). História das mulheres no Brasil. 9° ed. São Paulo: Contexto, 2008.

FALCI, Miridan Knox. Mulheres do sertão nordestino. In: Del Priore, Marry (org.). História das mulheres no Brasil. 9° ed. São Paulo: Contexto, 2008.

LOURO, Guacira Lopes. Mulheres na sala de aula. In: Del Priore, Marry (org.). História das mulheres no Brasil. 9° ed. São Paulo: Contexto, 2008.

TELLES, Norma. Escritoras, escritas, escrituras. In: Del Priore, Marry (org.). História das mulheres no Brasil. 9° ed. São Paulo: Contexto, 2008.

PEDRO, Joana Maria. Mulheres do sul. In: Del Priore, Marry (org.). História das mulheres no Brasil. 9° ed. São Paulo: Contexto, 2008.










[1] Artigo apresentado á disciplina História do Brasil (século XIX), sob orientação da docente Liliane Maria Fernandes Cordeiro Gomes.
[2] Alunas de graduação em História do Departamento de Educação – Campus X/UNEB, Teixeira de Freitas, Bahia.
[3] D`Incao, Mulher e Família Burguesa, p. 223.
[4] Knox, Mulheres do sertão nordestino, p. 249.

[5] Ibidem, p. 251.
[6] Louro, Mulheres na sala de aula, p. 447.
[7] Telles, Escritoras, escritas, escrituras, p. 406.

9 comentários:

  1. Algumas conquistas para nós mulheres é como se fosse um sonho nos atos mais simples, como se casar com quem a gente amasse, ter uma independência financeira...há tempos atrás isso era impossível. A mulher casava-se muitas vezes por contrato, com uma responsabilidade enorme de cuidar dos afazeres domésticos, e também ser responsavél pela parte SENTIMENTAL da família, esse artigo é muito interessante para refletirmos os avanços e as nossas grandes conquistas....
    muito bom!!!!!

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  2. A luta feminina por sua independência foi um processo longo que durou vários anos. As mulheres não queriam permanecer passivas diante da sociedade preconceituosa ao qual estavam submetidas, por isso ela foi conquistando pouco a pouco sua liberdade, deixando de desempenhar apenas o papel do lar.
    Todas essas conquistas se refletem nos dias de hoje. Esse trabalho é exelente para para que possamos perceber as transformações que passaram nas normas e costumes que a sociedade e particularmente as mulheres estavam submetidas.
    Parabéns!!!

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  3. Lendo sua materia, reflito em como a mulher vem evoluindo cada dia mais e mais, e me orgulho muito com essa atitude, vendo toda essa luta,
    é inadmissivel nos dias atuais ver nos noticiarios a ondacrescente de violência contra mulheres e não fazermos nada!

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  4. pro dia nascer é um documentario que refleti o descasos dos governantes pela educação alem de professores despreparados.

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  5. A LUTA FEMININA VEM DE LONGA DATA É BOM CONHECER MULHERES QUE LUTARAM PARA SEREM RECONHECIDAS EM SOCIEDADE TÃO PRECONCEITUOSA.

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  6. O tema mulher é sempreum tema interessante e complexo, é um tema que eu gosto muito, pois falar sobre a mulher é nos levar a algumas conquistas importantes da mulher, sabemos que muita coisa ainda precisa ser mudadar,e assim a mulher está em luta constante... Muito bom este artigo.

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  7. Conhecer o processo histórico de emancipação da mulher nos faz refletir sobre as rupturas e permanências ideológicas em relação a situação da mulher na atualidade.

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  8. É MUITO IMPORTANTE ABORDAR AS QUESTÕES SOBRE A MULHER E COMO ELA VEIO CONQUISTANDO SEU ESPAÇO AO LONGO DA HISTÓRIA, SEU ARTIGO ABORDA ELEMENTOS QUE MUITOS DESCONHECEM, POIS A MULHAR DE HOJE É O REFLEXO DE LUTAS, E IDEAIS DE LONGOS ANOS...

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  9. Elaine foi muito bom poder desenvolver esse artigo com você. Tem crescido o número de produções a respeito dessa temática, e isso aponta um grande progresso na luta da mulher por seu espaço, inclusive nas produções científicas.

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